segunda-feira, 19 de novembro de 2012

“Porque os ouvidos da minha vida se abrirão como as flores”, Adalgisa Nery





Esse blog passa a ater como título homônimo da coluna da jornalista Adalgisa Nery, que inspirou Carlos Drummond de Andrade e Murilo Mendes. Que sua coragem e vivacidade inspirem novas gerações que só querem ver um país forte e soberano.


Tive meu primeiro contato com Adalgisa Nery (Adalgisa Maria Feliciana Noel Cancela Ferreira, seu nome de batismo) no final do ano passado. Enquanto realizava uma pesquisa nas edições do jornal A Última Hora, do grande jornalista Samuel Wainer, me deparei com a sua coluna “Retrato sem retoque”.

A coluna de Adalgisa me chamou atenção pela vivacidade de suas palavras. Também pudera. Desde criança sua postura era essa: viva perante a inércia do status quo. Na adolescência, quando estudou em um colégio de freiras, foi expulsa por defender as órfãs que eram consideradas subalternas e, por isso, eram muito maltratadas.

Seu primeiro casamento foi com o pintor Ismael Nery, precursor do Modernismo no Brasil, com quem casou aos 16 anos e ficou até a morte do artista.

Depois de Ismael, Adalgisa casou-se com o jornalista e advogado Lourival Fontes, diretor do temível Departamento de Imprensa e Propaganda. Mas antes que um leitor já a julgue pela trajetória de seu marido é importante salientar – em tempo - que ela utilizava a profissão do seu marido como seu escudo para escrever sobre a história que participava.

Adalgisa era diferente dos personagens daquele enredo ditador. Ao visitar o México, mesmo em agenda de Lourival, ficou amiga de Diego Rivera – que chegou a pintá-la - e Frida Kahlo. Depois da separação do casal, Adalgisa escreveu histórias que só sabiam quem acompanhava o convívio dos militares.

Jornalismo e Política

Depois da sua separação com Fontes, Adalgisa mergulhou no jornalismo. Sua coluna é um verdadeiro retrato sobre a política no governo Vargas.

Por ter intimidade com as pautas militaristas, ela sabia o que estava por vir. E não ficou calada. Sua coluna denunciava os limites do militarismo, suas tramas e uma sólida opinião sobre o patamar e desafios do desenvolvimento do país.

Sua coluna foi um sucesso entre os leitores. Adalgisa era reconhecida por sua opinião e pelo enfrentamento que fazia às forças poderosas. E, como uma líder daquele tempo, foi eleita deputada três vezes, primeiro pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e, depois, pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB).

Em 1969 teve seu mandato e direitos políticos cassados e voltou a escrever poesia.

Poesia

Ela que já tinha sido a musa inspiradora de Carlos Drummond de Andrade e Murilo Mendes, após anos sem publicar poesias, voltou a escrever.

Quem lê os poemas de Adalgisa sente o peso de sua trajetória. Suas poesias são sofridas, desalentadas e solitárias, mas mesmo assim belíssimas.

Adalgisa morreu em uma casa de repouso, em 1980, três anos depois de ter um acidente vascular cerebral.

“E no faminto inconsciente, o tempo
Sorvendo com fúria o seu sustento
No insondável silêncio de mim mesma